CARTAS

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Cartas

Caro Nelson,

Tenho acompanhado com apreensão os últimos acontecimentos. Espero que esteja bem. No exílio aprendi que a resistência só termina quando vencemos.

Se cuide.

Chico.

 

Querido amigo Chico,

No auge do caos lembrei dos seus versos. “Amanhã vai ser outro dia”. A situação está terrível, mas resistirei até o fim.

Abraço,

Nelson.

 

Caro Luke,

Faz tempo que não falamos. Como está guerra nas estrelas? Sinto falta das suas histórias, das aventuras que me contava.

Por aqui, tudo na mesma, muito estudo, tentando comprovar outras teorias.

Como eu sempre te disse, o tempo é relativo. Por mais que a gente pense que não se vê há anos, pode ser que nos tenhamos visto há minutos. Por ora, continuemos nas cartas.

Saudações,

Albert.

 

Querido amigo Albert,

É ótimo ter notícias suas. Tenho certeza de que seu legado vai ser sempre lembrado.

Essa sua teoria me faz pensar todo dia que tudo é relativo. Semana passada, por exemplo, tive uma revelação estarrecedora. Descobri quem é meu pai. Meu maior inimigo. Como posso odiá-lo? Até ódio pode ser relativo.

Espero te encontrar em breve.

Abraço,

Luke.

 

 

– E aí, Roberto? Eles voltaram a trocar cartas?

– Pois é, rapaz. Esses dias estão agitados pra eles.

– São Francisco de Assis ainda está escrevendo?

– Que nada. Há meses não aparece. Essa semana teve Nelson Mandela, Chico Buarque, Luke Skywalker e Einstein.

– Vamos lá ver qual a surpresa de hoje.

Uma pilha de travesseiros separava as duas camas no quarto de três metros quadrados. Os enfermeiros entraram e viram os dois homens, cada qual num canto.

Um deles, usava óculos redondos, tinha deixado a barba e cantava “Imagine”, num inglês bastante duvidoso. O outro colocou uma almofada por dentro da camisa e, com voz grossa, entoava “Me dê motivo”.

Roberto e o outro enfermeiro perguntaram se não haveria cartas do John Lennon para o Tim Maia, ao que o barbudo respondeu:

– Vocês são cegos ou loucos? Não estão vendo que estamos cara a cara? Pra quê eu mandaria carta?

– Desculpe. Então sobre o que estão conversando? – perguntou Roberto.

– Conversando? Não percebe que nossa comunicação é através da música?

Os enfermeiros sorriram. Um pegou uma bacia e começou a batucar; o outro batia palmas.

O sósia do Tim Maia se animou:

– Bota agudo no bumbo, meu filho.

Repentinamente pararam e tiraram os apetrechos dos personagens. Em alguns minutos os dois pacientes apareceram vestidos de caçador.

– Nossa, o que vão caçar? – indagou o enfermeiro Roberto.

– Bom, eu vou caçar o Lobo Mau. E ele vai comer a vovozinha. Decidam qual é qual!

Pedro Fleury

“Retome o hábito da leitura. Contos impactantes. Textos com humor. Escrita de qualidade.”

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