O dono da venda era conhecido como Paulo boca-suja, não segurava as interjeições mais obscenas e abusava do “caralho” a cada fim de frase. Dona Anastácia, a respeitada beata do bairro, o maldizia todo santo dia após passar no mercadinho para comprar pão.
– Esse senhor não tem educação. Acredita que mandou o padeiro pegar a “porra” da sacola para me dar? Absurdo – desabafou ao passar no caixa.
(Ela não vai admitir que os palavrões daquele ordinário a incomodam. E ainda fica com essa cara de cu)
Na saída, deu de cara com Lolita, a mulher do taxista, e não perdeu a nova oportunidade para criticar Paulo boca-suja.
– Não sei por que a gente ainda frequenta aquela espelunca, um sujeito grosseiro daqueles.
– Realmente, dona Anastácia, é palavrão atrás de palavrão.
(Que hálito horrível, puta que pariu, vou me despedir rápido)
A cidade pacata havia se tornado mais perigosa. Os trombadinhas não perdoavam uma senhora distraída. Assim que dona Anastácia vacilou procurando a chave na bolsa, o pequeno larápio arrancou sua corrente de ouro.
– Pega ladrão, pega ladrão!
(Filho da puta)
Paulo boca-suja se aproximou correndo.
– O que houve, dona Anastácia?
– Ora, um vagabundo puxou minha correntinha e saiu correndo.
(Aquele merdinha)
– Calma, eu ajudo a senhora com a bolsa. Está machucada?
– Não, não. Estou bem.
(Se eu pego aquele moleque, vou foder com a vida dele)
– Venha, pode deixar que eu te levo pra casa.
Dona Anastácia, percebendo a gentileza, abriu um sorriso.
– Obrigada, Paulo. Muito atencioso de sua parte.
(Cacete, onde diabo coloquei a chave?)
– Não há de quê, dona Anastácia, vamos.
(Esqueci o forno ligado, caralho)