NÃO DURMA!

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Eu estava há dois dias, quatro horas e quarenta e poucos segundos sem dormir, não aguentava mais segurar as piscadelas, meu corpo se desligava aos poucos. Mas estava decidido a não permitir que ela me dominasse… não mais. Nem Krueger era tão forte nos sonhos quanto ela. Acordado eu tinha o controle dos meus pensamentos, conseguia evitá-la. Já dormindo, ela entrava no meu quarto, tomava conta da minha vida e eu não resistia aos seus carinhos. Não durma!, repetia a mim mesmo sem parar. A dor lancinante de amar aquela mulher definitivamente não me alcançaria mais, nenhum sono seria capaz de me vencer e fazer com que me entregasse aos seus abraços mais uma vez… nem uma vez mais. Os delírios do cansaço tentavam me ludibriar mostrando aquele sorriso perfeito, os cabelos encaracolados, sentia até o cheiro do perfume de lavanda. Ah, Maria, sua pele lisinha!… Não durma!, voltei a mim. Estava sem álcool, fatalmente dormiria no primeiro gole… e me lembraria ainda mais das noites em que, nus, tomávamos vinho jogando gamão no tapete da sala… e nos amávamos… ah, e como! Vou me entregar, não consigo mais, pensei. Não durma! Você é mais forte que isso, me concentrei dando tapas em mim mesmo. Nem passou pela minha cabeça lembrar do gosto de seu sexo no meu rosto, minha barba raspando nas coxas e meus olhos procurando os dela. Ainda bem que não amava mais Maria. Um grave ruído saiu da minha garganta. Deus meu! Ronquei de olhos abertos. Não durma!, dessa vez minha voz saiu baixinha. Minha sorte é que havia aprendido a controlar o amor. O duro era saber que aqueles lábios possivelmente tinham encontrado outra boca e os seios estavam em outras mãos. Ah, Maria, agradeço aos céus por não permitirem que você entre nos meus pensamentos enquanto estou acordado, me benzi. Sono insuportável… não aguentava mais… segurei enquanto pude… talvez uma rápida dormidinha não fizesse mal… talvez Maria estivesse ocupada com seu provável novo amor e não percebesse que dormi para me perseguir nos sonhos. Tá bom, durma um bocadinho, me permiti.

Estava enxugando a louça, o sol entrava pela janela da cozinha, mas não incomodava meus olhos. Maria entrou de camisola branca e pés descalços pela porta dos fundos. Ela ainda tinha a chave que, por um lapso, esqueci de pegar de volta. Logo aquele perfume de lavanda tomou conta de tudo e me arrancou um sorriso involuntário. Meus olhos automaticamente se viraram a ela. No sonho não tinha controle, esqueci da certeira dor que adviria mais tarde, não podia controlar o amor, era impossível evitar Maria com ela ali, na minha frente, jogando seu charme para me seduzir. Meus braços queriam tocá-la, possuí-la. Minha boca tinha sede de senti-la por inteira, da cabeça aos pés. Nem hesitei em cumprir meus desejos. Tivemos um ao outro em cima da pia, com a luz natural evidenciando nossos corpos, os puxões de cabelo e os olhos revirados de prazer.

Ah, Maria, que bom foi te amar mais uma vez. E a dor? Só a senti por pouco tempo… e dormi de novo, um sono profundo do qual escolhi não mais acordar, apenas para tê-la todos os instantes para toda a eternidade.

Pedro Fleury

“Retome o hábito da leitura. Contos impactantes. Textos com humor. Escrita de qualidade.”

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