Ele chegará com o olhar desorientado e o desequilíbrio costumeiro devido à corpulência, tentando se firmar enquanto emite um som contínuo em tom grave. Dará três abraços alternados, tocando com carinho seus ombros nos dele. Olhará dentro dos seus olhos como se procurasse enxergar sua alma e decifrar sua energia.
– Opchá, menino – ele dirá ao ajeitar o toco baixinho, varrendo-o com a mão e antes de se sentar.
– Salve, seu cigano!
– Salve você, seus ancestrais e todos que te acompanham – ele dirá ao colocar as cartas do baralho no chão. – Estou pronto pra responder o que você quiser e Ele permitir.
– Estou preocupado com meu irmão, será que ele vai morrer?
O cigano vai embaralhar e separar três pequenos montes. Pedirá a você que tire sete cartas e dirá:
– Ele poderá sobreviver, mas tudo dependerá de você.
– De mim? Mas se nem os médicos sabem direito o que ele tem, como eu vou ajudar?
– Ambos perderão. E no fim isso é que vai fazer vocês ganharem.
– Tem como ser mais específico, seu cigano?
– Haverá uma divisão em que quatro vão passar a ser dois, um de cada um, e, com isso, uma multiplicação do amor de vocês. Mas repito, isso será uma escolha sua.
– Eu vou fazer o impossível, seu cigano, mas o senhor não pode me dizer o que será?
– Só posso dizer que às vezes o amor se mede pelo sacrifício pessoal de cada um.
– Eu prometo que vou me sacrificar por ele, eu prometo, mas o senhor vai me ajudar?
– Promessas são o prenúncio do fracasso, menino.
– Mas eu prometo mesmo assim.
Você dará uma moeda de ouro quando ele fechar o jogo e sairá de lá aliviado com o sentimento de que você poderá salvá-lo.
…
Seu irmão morrerá seis meses depois. E sua recusa em doar seu rim compatível a ele trará remorso eterno. No próximo encontro o cigano dirá:
– Opchá, menino, não carregue culpa, foi sua escolha. Mas prepare essa saúde. Seu destino será o mesmo que o dele se também te recusarem o rim.
Você se espantará com a previsão e ele dirá:
– Ou achou que a doença não fosse hereditária?